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O CONTESTADO : 50 ANOS DEPOIS...

            GUERRA DO CONTESTADO

A luta só terminou quando o Supremo Tribunal Federal estabeleceu os limites entre os dois Estados. Foi assinado um tratado entre os dois governadores interessados: o mineiro Magalhães Pinto e o capixaba Chiquinho, em setembro de 1963.
      A Guerra do Contestado foi um conflito fronteiriço registrado no Noroeste capixaba entre as décadas de 1940 e 1960, envolvendo os Estados do Espírito Santo e Minas Gerais por causa de uma região rica e em grande desenvolvimento econômico.  Fatos históricos que marcaram a vida daquela região, são contadas até hoje,  por quem participou, viu e ouviu. Os fatos foram registrados nos mais diversos meios de comunicações e arquivos públicos dos estados envolvidos. A história conta que praças da força pública capixaba e mineira, foram para a fronteira dos estados, para garantir o direito de cada um deles.
O laudo do Exército Brasileiro dizia que a divisa do Espírito Santo com Minas Gerais passava pela Serra dos Aimorés e que de acordo com as informações, se fechava entre Itabirinha de Mantena e Mendes Pimentel. De acordo com o laudo, pertenciam ao Estado do Espírito Santo: Mantenópolis, Ametista, Itabirinha de Mantena, Ariranha, Limeira, Boa União e Divino das Palmeiras. Criou-se a situação de zona litigiosa, porque não tinha surgido outro nome definido. O conflito foi criado porque cada um dos estados-membros queria essa terra, e a disputa durou vários anos. Mantenópolis era a zona contestada.
Mantenópolis surgiu no início do século XX correntes migratórias buscavam o Norte do Espírito Santo, com preferência pelas regiões banhadas pelos rios Cricaré e Cotaxé. Vinham principalmente da Bahia e de Minas Gerais em busca de terras para o plantio (prevaleceu a subsistência) e da madeira da região. Com o aumento dos interesses estaduais, tanto de Minas Gerais, quanto do Espírito Santo e de empresas madeireiras, como a “BRALANDA”(convênio entre Brasil e Holanda), a região ficou cada dia mais tensa e disputada. Os conflitos mais sérios da região do Contestado aconteceram por volta dos anos 40, quando ocorreram várias mortes de invasores, dos dois estados.
O conflito do contestado foi marcado por disputas pessoais e institucionais e por isto não pode ser caracterizado apenas como uma disputa de “coronéis”. Era, com efeito, um conflito de “Estados”, afinal os interesses iam além do âmbito local. Minas Gerais não queria respeitar o laudo do Exército, tanto é que lá no período das eleições, era preciso da força do Exército para garantir as eleições, por ser uma zona contestada, uma região de fronteiras, por isso, precisava sustentar o cumprimento da lei. As PMs dos dois estados não tinham autonomia dentro da área contestada.
Segundo historiados, devido ao contestado aconteceram muitas injustiças, muitas mortes. As pessoas matavam aqui no Estado e procuravam proteção em Minas Gerais, ou seja, em outra comarca. Matavam em Minas Gerais e procuravam apoio no Espírito Santo. Os conflitos não terminavam porque o Espirito Santo e Minas não abriam mão das terras. Para instigar ainda mais a contestação, em 4 de janeiro de 1944, o governo de Minas criou o município de Mantena, englobando toda a área em litigio, Mendes Pimentel, Itabirinha de Mantena, Central de Minas, São João do Manteninha e Nova Belém, que pertenciam ao Espírito Santo, segundo laudo do Exército.
A produção de café e a extração de madeiras, naquela região, atraía a atenção de todos, inclusive das pessoas do Espírito Santo. Isto fez com que o  governo capixaba buscasse a força a retomada de Mantenópolis,  aumentando a triste história do Contestado. O então presidente da República, João Goulart pediu a intervenção do Supremo Tribunal Federal-STF, que estabeleceu os limites entre os dois Estados. Assim foi assinado um tratado que estabeleceu a paz, entre os dois governadores interessados: José de Magalhães Pinto (Minas Gerais) e Francisco Lacerda de Aguiar (Espírito Santo), em setembro de 1963.
A partir desta data a região do contestado foi divida ao meio, ficando a região de Mantenópolis para os capixabas e Mantena para os mineiros. Em 9 de dezembro de 1963, o Diário Oficial do Estado de Minas Gerais publicava a Resolução 569, do Governador Magalhães Pinto. Nela, estava definida, junto a "Lei 2084 do Estado do Espírito Santo" a linha divisória do município, entre os dois Estados ao norte do Rio Doce, com as delimitações que tem hoje, há 50 anos em paz.
FONTE: http://www.folhadiaria.com.br/materia/14/231/seguranca/casos-de-policia/guerra-do-contestado#.Vbt2t_NViko


As marcas do Contestado 50 anos após o litígio entre mineiros e capixabas

Conflito que durou mais de meio século e ainda é lembrado por quem viveu as confusões na região de Mantena


Quando setembro chegar, mineiros e capixabas terão motivos suficientes para fazer uma grande festa cívica e cultural, reverenciar a memória e celebrar um episódio de expressão nacional. Trata-se do fim da Guerra do Contestado, em 15 de setembro de 1963, quando, depois de décadas de litígio, Minas e Espírito Santo, pelas mãos, respectivamente, dos governadores Magalhães Pinto e Lacerda de Aguiar, assinaram um acordo de paz. A discórdia começou no início do século passado e seis décadas depois as relações entre os dois estados atingiram o auge do estremecimento, quase resultando em conflito armado.

O motivo era a disputa por uma área rica em plantações de café, o Contestado, de cerca de 10 mil quilômetros quadrados, pouco maior do que a Região Metropolitana de Belo Horizonte, e localizada na divisa dos dois estados. A briga pelos limites teve seu epicentro em Mantena, na Região do Vale do Rio Doce, a 450 quilômetros da capital, e em Barra de São Francisco, no Noroeste do Espírito Santo. As tropas de prontidão se estranharam, mas não chegaram ao combate. O episódio deixou marcas profundas em moradores e militares, que nunca se esqueceram dos anos de tensão e das confusões administrativas. “Essa história ainda precisa de estudos, está para ser escrita e pesquisada a fundo. As citações são sempre sobre a Guerra do Contestado, ocorrida entre 1912 e 1916, no Sul do Brasil, e nunca mencionam essa passagem”, diz o mestre em história Francis Andrade, que trabalha com projetos culturais na Prefeitura de Mantena.

Na próxima semana, os secretários de Cultura de Mantena e Barra de São Francisco se reúnem para traçar um plano de ação que vai durar até setembro. “Vamos convidar o nosso governador, Antonio Anastasia, e do Espírito Santo, Renato Casagrande, para participarem de uma cerimônia no marco existente na divisa dos estados”, afirma a secretária municipal de Mantena, Marinete Maria de Souza Lima. O obelisco de granito e carente de obras de restauração e reurbanização do entorno, segundo Francis, tem uma placa de bronze, na qual está escrito: “Este monumento demarca a linha de união entre os estados de Minas Gerais e Espírito Santo, inspirado nos sentimentos de brasilidade dos mineiros e espírito-santenses, interpretados pelos governadores José de Magalhães Pinto e Francisco Lacerda de Aguiar”.

Marinete diz que está sendo feito um levantamento sobre o Contestado, começando pela busca de fotos da época e formação de um arquivo. Uma prévia do material poderá ser vista numa pequena exposição a ser montada durante a comemoração do aniversário de Mantena, de 12 a 15 de junho. “Localizamos vários moradores que eram militares na época e registraremos os seus depoimentos”, conta a secretária, adiantando que o desfile de 7 de Setembro será totalmente dedicado ao episódio. Esbanjando saúde e lucidez, o soldado reformado da Polícia Militar capixaba Jorge Angélico Nolasco, de 91 anos, chegou à região de conflito em 1946, integrando o “contingente de 46”. Com a voz firme, por telefone, ele destaca: “Quem viveu a época do Contestado não pode esquecer. De lá para cá houve muitas mudanças, o asfalto chegou, veio a energia elétrica, a água encanada. Naqueles tempos, tudo era só capoeira”, recorda-se Jorge, ainda no batente trabalhando na livraria de sua família, no Centro de Barra de São Francisco, no Noroeste do Espírito Santo.


BABEL JURISdiCIONAL A história do Contestado – uma verdadeira “Babel jurisdicional”, como escreveu no seu livro Aspecto policial de Mantena (1958) o capitão da PM de Minas José Geraldo Leite Barbosa – tem suas raízes mais profundas em 8 de outubro de 1800, quando foi instituído um auto de demarcação, motivado pela abertura do Rio Doce à navegação, que determinava a instalação de um posto fiscal para evitar a comercialização clandestina de ouro e diamante de Minas. Um século depois, em 18 de outubro de 1904, os dois estados adotaram como linha divisória, ao norte do Rio Doce, a Serra dos Aimorés ou do Souza, que, com o tempo e confusão de denominações, se tornou o real pomo da discórdia. Em 1911, a montanha foi mantida na documentação, levando em conta, ainda, os marcos de 1800. “Enquanto os mineiros diziam que a Serra dos Aimorés estava situada em Água Branca, no Espírito Santo, os capixabas rebatiam, afirmando que era em Conselheiro Pena, em Minas. E, nesse meio, ficou a região contestada por ambos”, relatou ao EM o ex-prefeito de Mantena Adrião Baía, de 86 anos, que chegou à região aos 18, vindo de Mutum, no Vale do Rio Doce, para trabalhar como escrivão do crime. O certo mesmo é que a pendenga foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF) e, em 1914, resultou num “laudo arbitral”, confirmando a Serra dos Aimorés como divisor oficial. A partir de então, o clima não parou de esquentar e pôs em ebulição o medo, a insegurança e as ameaças. Segundo o ex-político, “toda localidade tinha dupla jurisdição, convivendo uma autoridade do Espírito Santo e outra de Minas. Quem torcia por Minas, registrava o filho em cartório mineiro, e quem era a favor do Espírito Santo fazia o contrário”. 




Mesmo sem confronto direto entre as tropas, a questão dos limites deixou um saldo grande de vítimas civis e militares, e o número total ainda é incerto. O fim da briga só começou em 1958, quando os dois governos retiraram as tropas da região e iniciaram as negociações com base em laudos periciais. Em seu livro O passado e o presente de Barra de São Francisco, as escritoras capixabas Marlídia Alves da Silva e Maria da Penha Gomes Lopes relatam que, em 1957, “moradores em pânico” abandonaram suas casas e se refugiaram em cidades vizinhas. 




LINHA DO TEMPO




1904 – Minas e Espírito Santo adotam uma linha divisória, ao norte do Rio Doce, tendo a Serra dos Aimorés como limite

1911 – Um convênio entre os estados confirma os limites na Serra dos Aimorés ou Souza, gerando confusão na região devido à dupla denominação do maciço

1914 – Supremo Tribunal Federal (STF) ratifica os limites na Serra dos Aimorés. A decisão é “contestada” pelos dois estados, iniciando-se o clima de tensão

1939 – Fracassa a primeira negociação entre os estados para resolver a pendência

1940 – Presidente Getúlio Vargas (1882-1954) designa o Serviço Geográfico do Exército para fazer levantamento na região do Contestado. A comissão formada por geógrafos e engenheiros militares elabora um mapa, no qual consta a mesma divisa das cartas anteriores

1942 a 1948 – Novos choques entre as polícias mineira e capixaba. Soldado de nome Pimenta assassina um militar mineiro devido a insultos e provocações. Nos morros perto de Mantena, soldados capixabas passam as noites em trincheiras à espera de invasão

1948 – Governo capixaba ordena a ocupação do território em litígio por 600 homens “em perfeita organização bélica” 
1949 – A região fica ainda mais em sobressalto com a chegada de novos contingente dos dois estados. A tensão aumenta até 1956, quando o governador mineiro Bias Fortes (1891-1971) vai ao encontro do presidente Juscelino Kubitschek (1902-1976), no Rio de Janeiro, e se declara pronto para a conciliação
1957 – Fim da paz que estava perto de ser conquistada. Um deputado capixaba declara à imprensa que “repeliremos a bala qualquer tentativa de agressão”. Para não pagar impostos aos agentes de Vitória (ES), Minas abre variantes fora do alcance dos postos fiscais capixabas
1958 – As negociações são reiniciadas, mediante formação de comissões em cada estado. O litígio vai a julgamento no STF, que também não encontra uma solução definitiva
1963 – Depois de estudo pelas comissões dos dois estados, a história do Contestado chega ao fim, com a assinatura, em 15 de setembro, de acordo entre os governadores Magalhães Pinto (MG) e Lacerda de Aguiar (ES)
FONTE: http://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2013/05/25/interna_gerais,394665/as-marcas-do-contestado-50-anos-apos-o-litigio-entre-mineiros-e-capixabas.shtml



HISTÓRIA DO CONTESTADO “50 ANOS

CONTESTADO 50 ANOS
Por saber da importância da data e também para relembrar uma época que marcou a histórica política administrativa da nossa região, quando enviados especiais vieram para região para cobrir o fato para a imprensa brasileira,  o Jornalismo Gazeta do Leste passa a apresentar uma série de reportagens sobre o tema  “CONTESTADO”.
Lembramos que no dia  15 de setembro de 2013, estará completado “50 anos” a assinatura do Acordo do Bananal, que selou a paz entre os Mineiros e os Capixabas, pondo um ponto final na secular disputa de terras.
Em nossa primeira reportagem abordamos o tema que saiu em manchete no Jornal Tribuna da Imprensa – Ano IX – N. 2.999 – edição de Sábado-/domingo, 27-28 de Julho de 1957, há exatos quase 56 anos atrás.
O Jornal “Tribuna da Imprensa” trazia naquele momento uma edição especial, com 3 cadernos e 24 páginas e a noticia principal dizia “FRACASSARAM ENTENDIMENTOS ENTRE MINEIROS E CAPIXABAS”,  completa reportagem em Mantena e São Francisco – (De Calazans Fernandes, enviado especial da TRIBUNA DA IMPRENSA).
Nas fotos estampadas em primeiro plano da edição mostrava uma das várias trincheiras que foram abertas próximo ao Q.G. de operações dos capixabas, quando um soldado preparava-se para ali ficar de prontidão. Outra foto paralela mostrava metralhadoras pesadas e fuzis que os soldados da cidade de Governador Valadares trouxeram para enfrentar a situação em Mantena.
A reportagem feita por Calazans Fernandes mostrava a situação daquele momento e dizia “Fracassaram totalmente os entendimentos realizados aqui e em São Francisco, entre as autoridades mineiras e capixabas, visando por fim à atual crise do Contestado”. Os participantes da reunião não deram sequer um informe oficial ou mesmo fizeram ata. Limitou-se a anunciar: “Os entendimentos fracassaram, tudo fica como está”.
A reunião das autoridades que representavam os dois governos aconteceu na Fazenda Três Barras, a 12 quilômetros de Mantena e a 20 metros de São Francisco, ainda dentro do território contestado. A reunião foi realizada na referida fazenda, que era de propriedade do cafeicultor Rafael de Carvalho, sócio e amigo do deputado mineiro José Fernandes Filho, mais conhecido por “Fernandinho” que era o acusado pelos capixabas de ser o  principal insuflador da situação, visando somente objetivos eleitorais, ligados a uma possível futura eleição a deputado federal, em chapa única pela região.
A situação naquele momento era dramática e a reunião prolongou durante toda a noite, não sendo conhecida uma solução. O jornalista Calazans Fernandes, que parecia escrever para os capixabas, descreveu o momento: “Contudo, a impressão é de que nenhum dos dois lados transigirá e a essa hora aumenta a movimentação de forças militares, na zona do Contestado. Os mineiros parece que organizaram a sua defesa – ou ataque  – em forma de pinça, para envolver as forças capixabas localizadas em São Francisco”.
“As forças mineiras, a essa altura, já estão assim divididas: 1.500 homens armados com metralhadoras pesadas (Hotckins) e de mão, em Mantena, dispostos a seguir sobre “Café Ralo”, Bananal, Mantenópolis, Itabira, Ariranha, e até São Francisco, se for preciso, enquanto que pelo lado da fronteira norte, entre Bahia e Espirito Santo, mais para o centro, nas cidades de Nanuque, Chagas, eles tem já uns 200 homens. Mais para o centro, abaixo de Mantena, em Aimorés, que também já pertenceu ao Espirito Santo, calcula-se que estejam concentrados 200 soldados”.
Outros subtítulos nesta matéria :”NENHUM ACORDO”, “MESMO IMPOSTO”, “ACABAR COM OS POSTOS FISCAIS”, “JK EM MANTENA”, “OITO MORTES POR DIA”, “CONFUSÃO DE PODERES”, “TUDO É BRASIL”, “AS MORTES SE SUCEDEM” E “45 INTERVENÇÕES CIRÚRGICAS”.
Sobre este último subtítulo a matéria relata: “O Dr. Edgar Carvalho, da Casa de Saúde de Mantena, diz que todos os meses atende a um mínimo de vinte baleados por pistoleiros. Na casa de Saúde Dr. Albuquerque, mas de 45 intervenções em pessoas, vitimas de projéteis de arma de fogo, foram feitas em menos de seis meses”, finalizando.
Depois destas situações narradas pela Tribuna da Imprensa, a luta politica e armada,   para que o acordo do ‘CONTESTADO”  acontecesse  durou exatamente  mais seis anos.
Muitas outras reportagens chegaram até os internautas e leitores do Jornalismo Gazeta do Leste e Mantena Agora, são momentos dramáticos vividos pelo nosso povo,  quando soldados mineiros lutaram para que o município fosse reconhecido como território de Minas Gerais.





Relembrando histórias sobre o Contestado Minas gerais/Espírito Santo


1904 – Minas e Espírito Santo adotam uma linha divisória, ao norte do Rio Doce, tendo a Serra dos Aimorés como limite
1911 – Um convênio entre os estados confirma os limites na Serra dos Aimorés ou Souza, gerando confusão na região devido à dupla denominação do maciço
1914 – Supremo Tribunal Federal (STF) ratifica os limites na Serra dos Aimorés. A decisão é “contestada” pelos dois estados, iniciando-se o clima de tensão
1939 – Fracassa a primeira negociação entre os estados para resolver a pendência
1940 – Presidente Getúlio Vargas (1882-1954) designa o Serviço Geográfico do Exército para fazer levantamento na região do Contestado. A comissão formada por geógrafos e engenheiros militares elabora um mapa, no qual consta a mesma divisa das cartas anteriores
1942 a 1948 – Novos choques entre as polícias mineira e capixaba. Soldado de nome Pimenta assassina um militar mineiro devido a insultos e provocações. Nos morros perto de Mantena, soldados capixabas passam as noites em trincheiras à espera de invasão
1948 – Governo capixaba ordena a ocupação do território em litígio por 600 homens “em perfeita organização bélica”
1949 – A região fica ainda mais em sobressalto com a chegada de novos contingente dos dois estados. A tensão aumenta até 1956, quando o governador mineiro Bias Fortes (1891-1971) vai ao encontro do presidente Juscelino Kubitschek (1902-1976), no Rio de Janeiro, e se declara pronto para a conciliação
1957 – Fim da paz que estava perto de ser conquistada. Um deputado capixaba declara à imprensa que “repeliremos a bala qualquer tentativa de agressão”. Para não pagar impostos aos agentes de Vitória (ES), Minas abre variantes fora do alcance dos postos fiscais capixabas
1958 – As negociações são reiniciadas, mediante formação de comissões em cada estado. O litígio vai a julgamento no STF, que também não encontra uma solução definitiva
1963 – Depois de estudo pelas comissões dos dois estados, a história do Contestado chega ao fim, com a assinatura, em 15 de setembro, de acordo entre os governadores Magalhães Pinto (MG) e Lacerda de Aguiar (ES)

–FONTE: See more at: http://www.vozdabarra.com.br/relembrando-historias-sobre-o-contestado-minas-geraises/#sthash.2GX9hFve.dpuf



Relembrando histórias sobre o Contestado Minas gerais/Espírito Santo

As marcas do Contestado 50 anos após o litígio entre mineiros e capixabas
Mineiros e capixabas terão motivos suficientes para fazer uma grande festa cívica e cultural, neste domingo(15 de setembro de 2013)reverenciar a memória e celebrar um episódio de expressão nacional. Trata-se do fim da Guerra do Contestado, em 15 de setembro de 1963, quando, depois de décadas de litígio, Minas e Espírito Santo, pelas mãos, respectivamente, dos governadores Magalhães Pinto e Lacerda de Aguiar, assinaram um acordo de paz. A discórdia começou no início do século passado e seis décadas depois as relações entre os dois estados atingiram o auge do estremecimento, quase resultando em conflito armado.
O motivo era a disputa por uma área rica em plantações de café, o Contestado, de cerca de 10 mil quilômetros quadrados, pouco maior do que a Região Metropolitana de Belo Horizonte, e localizada na divisa dos dois estados. A briga pelos limites teve seu epicentro em Mantena, na Região do Vale do Rio Doce, a 450 quilômetros da capital, e em Barra de São Francisco, no Noroeste do Espírito Santo. As tropas de prontidão se estranharam, mas não chegaram ao combate. O episódio deixou marcas profundas em moradores e militares, que nunca se esqueceram dos anos de tensão e das confusões administrativas. “Essa história ainda precisa de estudos, está para ser escrita e pesquisada a fundo. As citações são sempre sobre a Guerra do Contestado, ocorrida entre 1912 e 1916, no Sul do Brasil, e nunca mencionam essa passagem”, diz o mestre em história Francis Andrade, que trabalha com projetos culturais na Prefeitura de Mantena.

Amanhã(15), os secretários de Cultura de Mantena e Barra de São Francisco se reúnem para traçar um plano de ação que vai durar até setembro. “Vamos convidar o nosso governador, Antonio Anastasia, e do Espírito Santo, Renato Casagrande, para participarem de uma cerimônia no marco existente na divisa dos estados”, afirma a secretária municipal de Mantena, Marinete Maria de Souza Lima. O obelisco de granito e carente de obras de restauração e reurbanização do entorno, segundo Francis, tem uma placa de bronze, na qual está escrito: “Este monumento demarca a linha de união entre os estados de Minas Gerais e Espírito Santo, inspirado nos sentimentos de brasilidade dos mineiros e espírito-santenses, interpretados pelos governadores José de Magalhães Pinto e Francisco Lacerda de Aguiar”.
Marinete diz que está sendo feito um levantamento sobre o Contestado, começando pela busca de fotos da época e formação de um arquivo. Uma prévia do material poderá ser vista numa pequena exposição a ser montada durante a comemoração do aniversário de Mantena, de 12 a 15 de junho. “Localizamos vários moradores que eram militares na época e registraremos os seus depoimentos”, conta a secretária, adiantando que o desfile de 7 de Setembro será totalmente dedicado ao episódio. Esbanjando saúde e lucidez, o soldado reformado da Polícia Militar capixaba Jorge Angélico Nolasco, de 91 anos, chegou à região de conflito em 1946, integrando o “contingente de 46”. Com a voz firme, por telefone, ele destaca: “Quem viveu a época do Contestado não pode esquecer. De lá para cá houve muitas mudanças, o asfalto chegou, veio a energia elétrica, a água encanada. Naqueles tempos, tudo era só capoeira”, recorda-se Jorge, ainda no batente trabalhando na livraria de sua família, no Centro de Barra de São Francisco, no Noroeste do Espírito Santo.
BABEL JURISDICIONAL A história do Contestado – uma verdadeira “Babel jurisdicional”, como escreveu no seu livro Aspecto policial de Mantena (1958) o capitão da PM de Minas José Geraldo Leite Barbosa – tem suas raízes mais profundas em 8 de outubro de 1800, quando foi instituído um auto de demarcação, motivado pela abertura do Rio Doce à navegação, que determinava a instalação de um posto fiscal para evitar a comercialização clandestina de ouro e diamante de Minas. Um século depois, em 18 de outubro de 1904, os dois estados adotaram como linha divisória, ao norte do Rio Doce, a Serra dos Aimorés ou do Souza, que, com o tempo e confusão de denominações, se tornou o real pomo da discórdia. Em 1911, a montanha foi mantida na documentação, levando em conta, ainda, os marcos de 1800. “Enquanto os mineiros diziam que a Serra dos Aimorés estava situada em Água Branca, no Espírito Santo, os capixabas rebatiam, afirmando que era em Conselheiro Pena, em Minas. E, nesse meio, ficou a região contestada por ambos”, relatou ao EM o ex-prefeito de Mantena Adrião Baía, de 86 anos, que chegou à região aos 18, vindo de Mutum, no Vale do Rio Doce, para trabalhar como escrivão do crime. O certo mesmo é que a pendenga foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF) e, em 1914, resultou num “laudo arbitral”, confirmando a Serra dos Aimorés como divisor oficial. A partir de então, o clima não parou de esquentar e pôs em ebulição o medo, a insegurança e as ameaças. Segundo o ex-político, “toda localidade tinha dupla jurisdição, convivendo uma autoridade do Espírito Santo e outra de Minas. Quem torcia por Minas, registrava o filho em cartório mineiro, e quem era a favor do Espírito Santo fazia o contrário”.
Mesmo sem confronto direto entre as tropas, a questão dos limites deixou um saldo grande de vítimas civis e militares, e o número total ainda é incerto. O fim da briga só começou em 1958, quando os dois governos retiraram as tropas da região e iniciaram as negociações com base em laudos periciais. Em seu livro O passado e o presente de Barra de São Francisco, as escritoras capixabas Marlídia Alves da Silva e Maria da Penha Gomes Lopes relatam que, em 1957, “moradores em pânico” abandonaram suas casas e se refugiaram em cidades vizinhas.
LINHA DO TEMPO
1904 – Minas e Espírito Santo adotam uma linha divisória, ao norte do Rio Doce, tendo a Serra dos Aimorés como limite
1911 – Um convênio entre os estados confirma os limites na Serra dos Aimorés ou Souza, gerando confusão na região devido à dupla denominação do maciço
1914 – Supremo Tribunal Federal (STF) ratifica os limites na Serra dos Aimorés. A decisão é “contestada” pelos dois estados, iniciando-se o clima de tensão
1939 – Fracassa a primeira negociação entre os estados para resolver a pendência
1940 – Presidente Getúlio Vargas (1882-1954) designa o Serviço Geográfico do Exército para fazer levantamento na região do Contestado. A comissão formada por geógrafos e engenheiros militares elabora um mapa, no qual consta a mesma divisa das cartas anteriores
1942 a 1948 – Novos choques entre as polícias mineira e capixaba. Soldado de nome Pimenta assassina um militar mineiro devido a insultos e provocações. Nos morros perto de Mantena, soldados capixabas passam as noites em trincheiras à espera de invasão
1948 – Governo capixaba ordena a ocupação do território em litígio por 600 homens “em perfeita organização bélica”
1949 – A região fica ainda mais em sobressalto com a chegada de novos contingente dos dois estados. A tensão aumenta até 1956, quando o governador mineiro Bias Fortes (1891-1971) vai ao encontro do presidente Juscelino Kubitschek (1902-1976), no Rio de Janeiro, e se declara pronto para a conciliação
1957 – Fim da paz que estava perto de ser conquistada. Um deputado capixaba declara à imprensa que “repeliremos a bala qualquer tentativa de agressão”. Para não pagar impostos aos agentes de Vitória (ES), Minas abre variantes fora do alcance dos postos fiscais capixabas
1958 – As negociações são reiniciadas, mediante formação de comissões em cada estado. O litígio vai a julgamento no STF, que também não encontra uma solução definitiva
1963 – Depois de estudo pelas comissões dos dois estados, a história do Contestado chega ao fim, com a assinatura, em 15 de setembro, de acordo entre os governadores Magalhães Pinto (MG) e Lacerda de Aguiar (ES)



“Um verdadeiro Ninho de cobras”

A região do Contestado, principalmente nas áreas próximas a Barra de São Francisco, Mantena, Mantenópolis e Ecoporanga era do final dos anos 40 ao início dos anos 50 um verdadeiro ninho de cobras. A falta de definição da fronteira e os desencontros entre Minas e Espírito Santo contribuíram para a transformação da região em terra de ninguém. E isso estimulou a homicidas e pistoleiros de aluguel a elegerem a mesma como refúgio temporário ou definitivo. Muita gente disposta a mudar de vida e voltar a harmonizar-se com a lei mudou-se para a área e regenerou-se.
Outros entre idas e vindas, faziam seus “trabalhos” em outros locais e refugiavam-se ali. Muitos nomes ficaram na história. Nenhum entretanto foi maior que Neném Maria. Você já ouviu falar em Neném Maria? Seus feitos dariam enredo para dezenas de filmes de faroeste. Neném Maria começou a trajetória ainda garoto. Três características o marcaram muito desde o início. A altura descomunal, a coragem que chegava a loucura e pontaria infalível.
Ainda garoto, aos dezessete anos próximo a Aimorés entrou em luta corporal com dois homens em uma festa de forró e um deles caiu na besteira de puxar uma arma. Neném Maria foi mais rápido, sacou seu revólver e fuzilou os dois desafetos. Eles eram membros de duas famílias das mais ferozes pelos lados de Conceição do Capim. Sabedores do roteiro do moço nas idas a Baixo Guandu e Aimorés resolveram tocaiá-lo e resolver a questão numa curva da estrada.
Mas não sabiam com quem estavan lidando.
]Ele enfrentou a horda de inimigos e mandou balas para todos os lados. Os outros amargaram entre outras perdas um morto e cinco feridos. Neném Maria continuou a trajetória de terror. Aos vinte e seis anos de idade já ostentava número incalculável de crimes. E passou também a matar por encomenda, sendo apadrinhado por muitos coronéis das cidades próximas. Mas as coisas a partir de certo tempo começaram a ficar insustentáveis e ele foi “convidado” a buscar novos ares por uns tempos. E sabem para onde foi? Para a nossa Paulista, aqui de São Chico.
A fama dele era tão grande que estava sendo rastreado pela inteligência da polícia. E descobriram seu novo covil. Essas notícias chegaram ao coronel Lauro Farias então Delegado em São Francisco No distrito de Paulista, lugar que Neném Maria escolheu para morar, toda a semana ocorria crime. Por conta dele. O coronel foi então um dia visitar seu velho amigo Alfredo Fagundes, cuja fazenda ficava no distrito de Paulista. Percebeu que o fazendeiro estava amigo do bandido. Estava até protegido pelo Fagundes. Estava instalando um bar na vila.
Segundo o fazendeiro, Neném vinha das bandas do rio Doce porque Reginaldo Paiva, um de seus padrinhos, não agüentou com ele. De vez em quando ele perguntava a Alfredo Fagundes sobre Neném Maria e conversa em torno do bandido ia se alongando. O fazendeiro falava com entusiasmo, o coronel ouvia com receio e se apercebia do perigo de sua missão. Uma tarde, o coronel saiu da casa do Fagundes na direção do seu jipe, ouviu do fazendeiro que ele ia apresentar Neném Maria a ele.
O coronel ficou na porta da varanda acompanhando com olhar o jipe que vinha se aproximando largando uma fumaça amarela de poeira. Perto dele estacou. A poeira ainda caiu por cima do coronel. Mas enquanto o Fagundes buscava abrigo contra o incômodo da poeira, o coronel não tirava os olhos do homem. De repente ele saltou de dentro do jipe. Notou o coronel a bota vistosa de um pé que saia com dificuldade do carro. Logo que conseguiu ficar do lado de fora, à vista, estava na frente do coronel um homem alto, magro e musculoso, de chapéu de palha e um bonito blusão de couro. Feições fechadas.
Olhou o coronel e passou por ele. Mas Fagundes, ainda encolhido por trás da pilastra, não se arriscou a apresentar o bandido ao coronel. Dali se despediu do amigo militar e entrou para a sala com o amigo bandido. A figura de Neném Maria lembrava os nomes mais expressivos dos filmes do oeste norte-americano. Dos filmes de bang-bang que o coronel assistia muito nos cinemas do interior. O coronel saiu pensando:
O homem tinha no rosto tudo que se dizia dele. Cara de mau. Olhar de gente ruim – nisso o coronel era especialista. – Fiquei logo impressionado com o modo que Fagundes estava tratando do bandido. Eu também era seu amigo. Ainda se dava muito bem com o homem o juiz de Paz de Paulista. O Nelson. Que diabo – disse comigo. O negócio vai ficar mais difícil. Afinal eram aqueles dois os líderes do lugar. Prometi vigiar o homem passo a passo. Coloquei três soldados e um sargento no lugar de sua morada.
Volta e meia o homem vinha na sede do município. Entrava em qualquer bar para tomar uma cerveja. Sentava-se sempre no fundo do bar. Com as costas para a parede. As moças tinham admiração por ele. Mas ele não era de dar confiança a nenhuma delas.Neste período já estava na casa dos trinta anos e vivia em companhia de uma bela mulher. Trouxe das bandas do rio Doce. Soube que ele tinha desafiado a polícia mineira. Nunca ninguém, em época alguma, tinha prendido Neném Maria. Em Paulista ele levou um rapaz como sócio do bar. O bandido não parava. Vivia sumido, viajando. No bar só aparecia o seu sócio.
O sócio progrediu muito. Os negócios iam muito bem na venda. Inexplicavelmente numa noite deram uns tiros no sócio de Neném Maria. Mas ele deu sorte e escapuliu. Num dia de sol forte, em plena luz do dia, um estranho, certamente um pistoleiro importado pelo bandido, acertou o sócio. Matou e fugiu no jipe do Neném Maria. Nessa altura já existia uma infinidade de crimes em Paulista. Tinham amedrontado a população. Por esse motivo, mais de 20 famílias tinham se mudado de lá.
O secretário do Interior e Justiça, coronel Darcy Pacheco de Queiroz, tinha recebido um abaixo-assinado da população, pedindo providências contra Neném Maria. Dizia o documento que ele matava impunemente. Não passava uma semana sem morrer um. O secretário, que tinha mandado o coronel para prender o bandido, mandou dizer para ele andar depressa. Estava demorando muito.
É o Coronel Lauro Farias quem conta – “Um dia, logo em seguida, mataram um coitado que tinha acabado de deixar a cadeia. Tinha no bolso o seu alvará de soltura do juiz de Direito do município. Por esse tempo, para sorte minha, o Fagundes estava rompido com o Neném. Soube e voltei na sua fazenda. Chegando lá vi um homem com medo. Logo o Fagundes, que não conhecia medo. Pelo menos até a chegada de Neném Maria na sua terra.
Nesse dia tentei falar com a população. Aproveitando a ausência dele. Mas nenhum deles teve coragem para denunciar o homem. Diziam que não eram doidos. Não pronunciavam nem o seu nome. Quando eu falava sobre ele, as pessoas me pediam para falar baixo. Só me atendiam de porta fechada e falavam para eu sair de suas casas pelos fundos. De modo a não deixar ninguém me ver”.
Na morte do sócio, Neném tem um gesto de solidariedade. Ou seria de cinismo? O corpo do moço tinha sido levado para Barra de São Francisco. Foi um dia que saíram de vez mais 10 famílias de Paulista. No cemitério de Barra de São Francisco, além de muita gente do lugar, encontrava-se também o coronel Lauro Farias. Quando o caixão ia chegando no cemitério apareceu o jipe de Neném Maria. Parou na porta. Ele saltou, dentro do blusão de couro vistoso, trazendo uma coroa de flores feita de qualquer maneira. Mas tinha uma faixa. Dizia: “Com as saudades do amigo Neném Mari”. O medo de Fagundes levou-o a mandar chamar o coronel. Ele tinha resolvido contar as coisas do bandido:
Meu amigo resolveu me contar tudo – explica o coronel. Me disse que Neném era o autor de todos os crimes de Paulista. Não estava me dizendo nenhuma novidade. Apenas me confirmava as coisas que eu já sabia. Fagundes já tinha experimentado vários problemas por causa de sua família. Tinha uns parentes danados para arrumar encrenca. Era gente perigosa. Mas perto do Neném Maria eles não eram nada valentes. Nesse encontro o fazendeiro me confessou sua intenção de matar o bandido. Tinha armado a família toda com esse objetivo.
O coronel morava no quartel de polícia. Uma construção moderna feita para abrigar as tropas na época do Contestado. Ele fez várias modificações, entre elas fechar mais a boca de um enorme fogão para cozinhar sem desperdício de lenha sua comida. Era o sossego do coronel. Uma fortaleza, pois ficava nas imediações da delegacia. Só chegavam perto os amigos íntimos. Os outros tinham de esperar amanhecer o dia. Mas essa noite bateu lá um amigo: Nelson, o juiz de Paz de Paulista. Foi chegando com os olhos espantados e pedindo proteção ao coronel. Queria um lugar seguro para viver distante de Neném Maria. Foi chegando e falando:
Coronel, o Neném Maria veio hoje me matar. – Senta homem – disse o coronel. E pensei: ele era tão amigo do bandido e agora que a coisa tinha apertado, vinha para o meu lado. Falou de uma carabina que tinha emprestado ao bandido. Nelson não morava mais em Paulista. Já tinha corrido para Barra de São Francisco, há mais de 20 dias. E ele tinha me contado: Neném tinha descido do ônibus naquele momento com um saco contendo duas carabinas. Vinha com dois revólveres na cinta.
A ponta de um punhal aparecendo na abertura do blusão de couro que cobria os revólveres, mas não dava para se identificar pelo volume as armas. Nesse momento o coronel começou a imaginar como ia prender o homem. Sua maior preocupação sobre tudo era a circunstância de não existir contra o bandido qualquer depoimento. Ninguém, isso ele tinha certeza, seria capaz de se apresentar para depor contra o bandido.
Era prender e soltar imediatamente. Mas as armas em poder dele eram o pretexto da prisão. Porte de arma ilegal. Pensou o coronel no melhor meio de alegar razões para prender o bandido. Mas saiu pensando fixo numa coisa: as mortes do homem não aparecia nenhum corajoso para contar.

Por:Jader Pereira

Historiador – Teólogo – Jornalista

                     “A morte de Neném Maria”
O resto da noite o coronel utilizou para pensar nas formas de pegar o bandido. Lembrou do sucesso de Aristides Coimbra. Mas logo se refazia nas suas estratégias, pois o adversário agora era muito mais perigoso que os demais. Não tinha realmente outro jeito. Teria de prender o bandido por porte ilegal de armas. As suas armas serviriam do testemunho. Só a arma teria a petulância de testemunhar contra Neném. Porque gente não tinha para isso naquele lugar. Mas exigia que ele enfrentasse o homem. De manhã, já de olheira de noite indormida, o coronel saiu para o combate contra Neném Maria. Chamou dois soldados de confiança e desceu o quartel. Só no meio do caminho contou a missão: prender Neném Maria. Os soldados olharam firme o coronel. Ele tornou a confirmar:
– Vamos prender Neném Maria. Já mandei dois soldados na frente para espiar o homem. Vocês vão comigo aqui no jipe. O coronel também tinha um jipe, desceram juntos deixando o jipe na rua de trás da avenida principal de Barra de São Francisco. Num lugar em que tinha marcado com os outros soldados que foram espiar o bandido. Estavam voltando e contaram a posição de Neném. Tinha estado numa cadeira de engraxate tratando de sua bota de couro cru. Saiu em direção ao restaurante de Afonso. O coronel pegou dois soldados destemidos: José Cupertino e João Silva. Deu instrução:
– Todos atentos. Os olhos grudados no homem. Os revólveres nos bolsos, deixando outro na cintura para disfarçar. Mão dentro dos bolsos e dedo no gatilho. O coronel imitou os soldados. Foi na frente deles deixando os soldados guardar uma distância de 2 metros para trás. Caminharam mais de 200 metros pela avenida Jones dos Santos Neves. Foram sem qualquer dificuldade até as proximidades do bandido. Este, que estava no passeio em frente do restaurante, olhando o movimento da cidade, nem se incomodou. O coronel aproximou-se dele. E foi cumprimentando como gente civilizada:
– Bom dia seu Neném.
– Bom dia – respondeu o bandido.
– Queria falar com o senhor lá dentro.
– Vamos entrar – convidou o outro.
O coronel entrou e os dois sentaram-se numa mesa do restaurante. Os dois soldados ficaram na porta. Olhavam os movimentos do bandido. Continuavam com as mãos nos bolsos. Com o dedo no gatilho. Lá dentro os dois conversavam:
– Estou sabendo que o senhor está muito bem armado, me entregue as armas – ordenou o coronel.
– Pois não – respondeu-lhe Neném Maria.
Em seguida tirou o cinturão e passou dois revólveres para o coronel. Nesse momento o coronel foi obrigado a tirar do bolso uma de suas mãos, ocupada com um revólver apontado para o bandido, por debaixo da mesa.
– Onde está o resto? Tornou a indagar o coronel.
Ele levou o delegado ao quarto. Sempre acompanhado pelos soldados. Neste instante já tinham chegado mais dois soldados. Estavam em torno do restaurante. No seu aposento entregou dois embrulhos grandes. Um continha balas 38 e o outro 44. Mas o coronel queria saber das carabinas. O bandido pediu que o militar o acompanhasse ao boteco do ponto do ônibus de Mantena. O coronel colocou-o ao seu lado no jipe, que nesse instante tinha se aproximado do restaurante trazido por outro soldado. Ia o coronel no volante, dois soldados no banco de trás e o resto a pé. O coronel dirigia o jipe devagarzinho. Em seguida. A fim de permitir que os soldados a pé não ficassem longe de Neném Maria. Chegando lá entraram os quatro. O coronel, os dois soldados e Neném. No balcão ele falou com o dono do botequim, seu amigo Manoel:
– Vai lá dentro e traga as carabinas.
O homem nem perguntou nada. Foi a outro compartimento do armazém e voltou com um saco. Dentro estavam duas carabinas da melhor qualidade: Merlim Cestadas. O coronel levou Neném para a delegacia.
O Povo Voltou às Ruas…
Com a prisão do bandido, uma notícia que em poucas horas não era só do conhecimento da cidade, mas de todo o município, fez com que o povo voltasse sem susto às ruas. A rua principal virou um formigueiro. O pessoal deixou o trabalho para comentar a façanha do militar. Rodinhas se formavam por toda a rua principal. Qualquer pessoa que vinha das bandas do quartel dava entrevista ao pessoal. Somente em Paulista, onde Neném tinha desenvolvido a sua atividade de bandoleiro, o povo entrou em pânico. O Alfredo Fagundes mandou dizer para o coronel ter cuidado. Iam chegar logo os amigos do bandido.
Mas na sua sala, o coronel Lauro ria por dentro, apesar do receio que estava tomado. Ele tinha escolhido de propósito a sexta-feira de carnaval para prender Neném. Quando não tinha mais autoridade nenhuma na cidade. O juiz tinha ido passar o carnaval fora. As comunicações ficavam prejudicadas por causa das festas carnavalescas. O coronel contaria com esse tempo todo. Seus amigos certamente estariam fora. Mandou esvaziar uma cela. Destinou a Neném Maria.Novamente vinha informação de Fagundes: estava apavorado com a prisão do inimigo. Para ele a melhor solução era o bandido morto. Nisso a mulher de Neném saiu de fininho no jipe dele e foi parar em Baixo Guandu.
Aparecem os Amigos…
Aparece na frente do coronel o Reginaldo Paiva. Veio para soltar Neném Maria. Vinha dizendo que eu era o primeiro polícia que tinha tocado ele na cadeia. O crime era afiançável. O coronel soltou o bandido com uma condição imposta ao seu amigo, o fazendeiro Paiva. Que levasse o homem para longe e que ele nunca mais voltasse a Paulista ou Barra de São Francisco. O amigo de Neném assumiu o compromisso. No mesmo instante colocou o rapaz no seu automóvel e levou-o para Baixo Guandu.
Fagundes não Acreditou em Nada…
– Quando eu me achava muito satisfeito com o resultado de tudo – fala o coronel – me chega o amigo Alfredo Fagundes.
– Coronel, o senhor soltou o homem?
– Sim – respondi – mas o senhor pode ficar tranqüilo que tenho o compromisso de uma pessoa de palavra que ele não volta mais.
– Pois está enganado – tornou a falar com o coronel, Fagundes.
– Não tenha medo – voltou a comentar o militar.
– Esse homem volta coronel. Vai nos passar todos na bala.
O Azar dos Nogueira. A sorte do Coronel…
Neném Maria foi chegando a Baixo Guandú, foi entrando em encrenca. Era uma terça-feira de carnaval, todo mundo na rua. Ele resolveu olhar a festa. Deu de frente com os Nogueira – dois irmãos – matou-os. Mas saiu baleado nesse tiroteio. Seus adversários também sabiam usar o gatilho de um revólver. Essa notícia chegou como um raio em Barra de São Francisco. Logo apareceu Alfredo Fagundes:
– Eu não disse coronel? – entrou bravo. – Agora que a gente se cuide. Nós e o senhor. Eu avisei para o senhor que Neném não era de se prender. Era de se matar. Eu sabia que ele não ia perdoar a vergonha da cadeia. O senhor não vai escapar. Bateu na cobra e deixou para mim. Eu tenho de me cuidar. Aprenda a lição, coronel.
A notícia tinha deixado o coronel gelado. Mas Neném tinha atravessado para os lados de Minas Gerais. Foi o seu azar. Pois no seu encalço estavam os homens do capitão Pedro( PM mineiro, o mais terrível caçador de bandidos do Rio Doce), seus policiais cercaram uma pequena estrada e detiveram o jipe do bandido. Todos de metralhadora. Neném saiu de dentro do carro atirando com as duas mãos buscando o mato. Mas não alcançou. Tinha sido atingido por uma centena de tiros. Seu corpo estava todo cortado de bala. Tinha dois revólveres na cinta e dois na mão. O punhal com a cabeça de leão à mostra. Estava morto. Dois fazendeiros que estavam em sua companhia no jipe também foram mortos.
Uma Testemunha Séria…
Durante algum tempo o coronel Lauro procurou saber de todas as pessoas que vinham das bandas de Baixo Guandu como foi a morte do bandido. Ouviu muitas histórias. Muitas conversas. Todos asseguravam que Neném Maria estava morto. Mas nenhum tinha visto o seu corpo. O coronel ficava intrigado. Ele precisava de um que tivesse visto o homem morto. Naquele tempo, o coronel costumava pensar:
– Uma fera daquela tem muito fôlego.
Mas finalmente chegou um dia um homem amigo do coronel. E disse para ele:
– Coronel, Neném está morto de verdade. Eu vi o homem dentro do caixão. Eu acompanhei seu enterro. Vi o homem ser enterrado. Ele não existe mais. Só aí o coronel se convenceu do fim de Neném Maria. Mas, de vez em quando, o coronel ainda sonha com ele. Ele aparece sempre de blusão de couro, com dois revólveres na cinta e a cabeça de leão do punhal… metendo medo em todo mundo.
Jader Alves Pereira
Historiador – Teólogo – Jornalista
Jader Pereira é Colunista no Vozdabarra
FONTE:http://www.vozdabarra.com.br/relembrando-historias-sobre-o-contestado-minas-geraises/



Minas e Espírito Santo celebram 50 anos do Contestado

EVENTO QUE SERÁ REALIZADO NO POVOADO DE BANANAL, EM MANTENA, NA DIVISA DOS DOIS ESTADOS, DEVERÁ CONTAR COM PARTICIPAÇÃO DO GOVERNADOR ANASTASIA


SOLDADOS MINEIROS ficaram de prontidão para atacar. Do lado do Espírito Santo, soldados também montaram guarda, mas o conflito acabou sem atrito
GOVERNADOR VALADARES -
O Cinquentenário do fim do Conflito do Contestado será celebrado no próximo domingo (15), no povoado de Bananal, em Mantena. A cerimônia, prevista para começar às 10h, possivelmente contará com a participação dos governadores dos estados de Minas Gerais, Antônio Augusto Junho Anastasia, e do Espírito Santo, Renato Casagrande. Um novo marco será inaugurado ao lado da estrutura de 50 anos, que celebrou a assinatura do Acordo de Paz, feito pelos governadores Magalhães Pinto [Minas] e Lacerda de Aguiar [Espírito Santo] em 15 de setembro de 1963.
Números culturais, homenagens a ex-prefeitos, pessoas e familiares de cidadãos ligados à história do Contestado, além de exposição de várias fotos da época, depoimentos em vídeo e objetos fazem parte do evento.  
O prefeito de Mantena, Wanderson Elizeu Coelho, destaca o que representa a comemoração dos 50 anos do Contestado. Coelho afirma também que o principal objetivo do evento é celebrar a paz firmada entre os municípios de Mantena (MG) e Barra de São Francisco (ES).
“Para nós é um evento muito importante no sentido histórico. Fomos dependentes de várias famílias que lutaram aqui para preservar a demarcação como Estado de Minas. Muitas pessoas morreram defendendo essa causa. Esse acordo político, feito para a demarcação há 50 anos, colocou realmente fim à guerra do Contestado. E hoje estamos comemorando a paz. A finalidade é reafirmar a paz entre os dois estados e, principalmente, entre duas cidades vizinhas [Mantena e Barra de São Francisco], que estão separadas exatamente pela mesma quilometragem, cinco quilômetros até o marco divisório [povoado de Bananal]”, ressaltou o prefeito.
Wanderson Coelho destacou a participação de autoridades políticas e militares na comemoração. “Para nós é um fato histórico muito importante e um ato cívico também. Estamos mobilizando todas as escolas, todos os alunos para participarem desse evento. Vai ter a participação de várias autoridades políticas e militares que participaram desse processo”, afirmou, ressaltando que a região tem a ganhar com a presença dos governadores do Estado de Minas e do Espírito Santo.
O prefeito de Mantena comentou também que durante a solenidade, além de ser inaugurado um novo marco, os governadores Antônio Anastasia e  Renato Casagrande receberão títulos de cidadão dos respectivos municípios. “Iremos inaugurar um novo marco, 50 ano depois. A gente já preparou o local, e a inauguração terá a presença dos dois governadores e de várias autoridades políticas e militares. Além disso, os dois [governadores] receberão o título de cidadão, cada um de seu estado”, disse.
O CONFLITO
O conflito foi originado por causa da disputa de uma área rica em plantações de café, o Contestado, de aproximadamente 10 mil quilômetros quadrados, pouco maior do que a Região Metropolitana de Belo Horizonte, localizada na divisa dos dois estados. A briga pelos limites teve seu ponto principal em Mantena, no Vale do Rio Doce, a 450 quilômetros da Capital, e em Barra de São Francisco, no Noroeste do Espírito Santo.
As tropas de prontidão que vieram das capitais e permaneceram por longo período nas duas cidades chegaram a se estranhar, mas não partiram para o combate. Um evento dessa magnitude só tem familiaridade no Sul do Brasil, quando ocorreu a Guerra do Contestado, entre 1912 e 1916, ou seja, quatro anos de conflito contra mais de meio século contabilizado entre Minas Gerais e Espírito Santo. Depois de décadas de litígio, ambos os estados, pelas mãos dos governadores Magalhães Pinto [Minas Gerais] e Lacerda de Aguiar [Espírito Santo] assinaram um acordo de paz que deu fim ao imbróglio político-militar que levou dezenas de vidas, de ambos os lados.
A discórdia começou no início do século passado e, seis décadas depois, as relações entre os dois estados atingiram o auge do estremecimento, quase resultando em conflito armado, o que poderia aumentar ainda mais o número de baixas já registradas pelos dois estados até a assinatura do documento, em 15 de setembro de 1963.
LINHA DO TEMPO
1904 – Minas e Espírito Santo adotam uma linha divisória, ao norte do Rio Doce, tendo a Serra dos Aimorés como limite
1911 – Um convênio entre os estados confirma os limites na Serra dos Aimorés ou Souza, gerando confusão na região devido à dupla denominação do maciço
1914 – O Supremo Tribunal Federal (STF) ratifica os limites na Serra dos Aimorés. A decisão é “contestada” pelos dois estados, iniciando-se o clima de tensão
1939 – Fracassa a primeira negociação entre os estados para resolver a pendência
1940 – Presidente Getúlio Vargas (1882-1954) designa o Serviço Geográfico do Exército para fazer levantamento na região do Contestado. A comissão formada por geógrafos e engenheiros militares elabora um mapa no qual consta a mesma divisa das cartas anteriores
1942 a 1948 – Novos choques entre as polícias mineira e capixaba. Soldado de nome Pimenta assassina um militar mineiro devido a insultos e provocações. Nos morros perto de Mantena, soldados capixabas passam as noites em trincheiras à espera de invasão
1948 – Governo capixaba ordena a ocupação do território em litígio por 600 homens “em perfeita organização bélica”
1949 – A região fica ainda mais em sobressalto com a chegada de novos contingentes dos dois estados. A tensão aumenta até 1956, quando o governador mineiro Bias Fortes (1891-1971) vai ao encontro do presidente Juscelino Kubitschek (1902-1976), no Rio de Janeiro, e se declara pronto para a conciliação
1957 – Fim da paz que estava perto de ser conquistada. Um deputado capixaba declara à imprensa: “Repeliremos à bala qualquer tentativa de agressão.” Para não pagar impostos aos agentes de Vitória (ES), Minas abre variantes fora do alcance dos postos fiscais capixabas
1958 – As negociações são reiniciadas, mediante formação de comissões em cada estado. O litígio vai a julgamento no STF, que também não encontra uma solução definitiva
1963 – Depois de estudo pelas comissões dos dois estados, a história do Contestado chega ao fim, com a assinatura, em 15 de setembro, de acordo entre os governadores Magalhães Pinto (MG) e Lacerda de Aguiar (ES)

Um comentário:

  1. Amei saber essa parte da história do estado que nasci. Parabéns!!!!@

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